quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Sustentabilidade: o valor intangível que vale milhões

* Rogerio Ruschel é diretor executivo do Instituto Brasil Verdade. Presidente da Ruschel & Associados Marketing Ecológico, foi professor universitário por mais de 25 anos, é coordenador do Prêmio Ambiental von Martius, da Câmara Alemã, jornalista e autor dos livros “Guia Ruschel de Ecologia”, "A caminho do desenvolvimento sustentado" e do “Glossário de Informações Ecológicas para Jornalistas”.

Frequentemente ouço empresários dizerem que a busca por sustentabilidade socioambiental por uma empresa atrapalha sua necessária busca por lucro; que meio ambiente atrapalha o desenvolvimento – a chamada “Síndrome do Bush”; que a sustentabilidade socioambiental de uma empresa é um valor intangível que não dá lucro. Estão todos equivocados – e perdendo dinheiro, muito dinheiro.

Na verdade ainda existem pessoas que não dão valor a valores intangíveis. Para situá-los, lembraria o livro “The Business Case for Corporate Citizenship” (Arthur D. Little, 2002), que informa que em 1981 o valor das companhias relacionado a intangíveis era de 17%, e que este valor saltou para impressionantes 71% em 1998 - e deve ser ainda mais elevado neste princípio de Século XXI porque em muitas empresas a marca ou a sua cultura empresarial é seu maior patrimônio.

Intangivel é algo no qual não podemos tocar, como solidariedade, alegria e “o jeito de ser” de uma pessoa. Do ponto de vista da Cultura, a experiência acumulada de valores como esses, impressa no DNA de uma sociedade que constitui uma Nação, é um bem intangível. E isto vale dinheiro? Sim, até mesmo no Brasil: o Ministro Gilberto Gil propôs o tombamento de intangibilidades da cultura brasileira como bens sobre os quais será possivel aplicar legislação de incentivo fiscal, como uma obra de arte, um filme e a publicação de um livro, bens tangíveis, nos quais se pode tocar.

Credibilidade, confiança, honestidade e reputação também são valores intangíveis. Mas podem ser valorados? Sim: a preferência de uma pessoa – no papel de cidadão, eleitor ou consumidor - por uma proposta, um candidato ou empresa que demonstrem ou ofereçam estes valores é fácilmente tangibilizada em números. Alguns exemplos: os quase 100.000 sócios da Fundação SOS Mata Atlântica, os mais de 500.000 votos do Deputado Fernando Gabeira, ou ainda a preferência pela compra de produtos mais caros de uma empresa “conhecida” significam valor econômico.

Ou seja: valores intangíveis podem se transformar facilmente em vantagem competitiva para pessoas e para empresas e o mundo dos negócios oferece exemplos concretos – o mais conhecido é o preço que uma marca pode alcançar, mesmo quando todo mundo sabe que este valor não corresponde a ativos mensuráveis como um equipamento, um prédio ou um caminhão.

A lógica de mercado

Investidores já descobriram isto: ações de empresas com reputação de sustentabilidade socioambiental têm alcançado valorização superior em até 12% em relação às ações de empresas sem este valor intangível. Quem oferece este número é uma comparação da evolução histórica do valor das ações de empresas listadas nos índices DS 400 – Dow Jones Sustainability (sustentáveis) e S&P 500 (convencionais) situada em média, em torno de 6% nos últimos 10 anos – o que também explica a “fila de espera” por empresas brasileiras que desejam participar do ISE da Bovespa.

Outro exemplo? O IFC – International Finance Corporation, braço financeiro do Banco Mundial, ofereceu autonomia ao Banco Real/ABN-AMRO na análise de risco de empréstimos do produto Financiamento Socioambiental IFC a empresas. Certamente além de prestigio, esta exclusividade se transformou em um grande diferencial competitivo, reduzindo custos e permitindo agilidade.

Esta valorização significa também uma vantagem competitiva para as empresas, e um exemplo claro é que as taxas de financiamento dos grandes bancos – e até mesmo do estatal BNDES – têm índices menores para empresas com reputação (e prática) de sustentabilidade socioambiental.

Tudo isto está perfeitamente de acordo com a lógica do mercado, porque emprestar dinheiro para empresas que têm equipamentos modernos (com menor risco de acidentes e multas), funcionários motivados (com menos processos trabalhistas, menor custo de atração e manutenção de talentos) e programas de redução de consumo de energia e matéria-primas (que reduzem custos operacionais) é mais barato.

Investir na intangibilidade dos fornecedores também melhora a tangibilidade dos lucros: como a legislação prevê a co-responsabilidade em relação a problemas apresentados por produtos no mercado, empresas que investem ou incentivam a qualificação socioambiental de seus fornecedores ou clientes também têm vantagens fácilmente contabilizáveis. Isto é óbvio: ao diminuir o risco de meu “sócio na legislação” de oferecer um produto com problemas potenciais de saúde ou segurança, o meu risco também diminui. As montadoras de automóveis, frequentemente obrigadas a fazer recalls que o digam…

Inovação e sustentabilidade

Outro valor que resulta da adoção de políticas de sustentabilidade socioambiental por uma empresa é a inovação. A inovação – que alguns consideram um valor intangível - também é fácilmente tangibilizável e é frequentemente apontada como um dos fatores determinantes da competitividade no atual mundo globalizado. O sucesso de empresas que adotam a inovação como valor corporativo, como as badaladas GE e Apple, é considerado benchmark de mercado.

Mas fiquemos com um exemplo mais próximo e totalmente cartesiano: a Incubadora de Fundos Inovar, criada pela FINEP para estimular a criação de fundos de venture capital no Brasil já possui R$ 600 milhões em 13 fundos, que juntos investiram em cerca de 50 empresas inovadoras. E com que resultados? Em apenas 4 anos a FINEP recebeu mais de tres vezes o valor investido, com uma Taxa Interna de Retorno de 42,68% anuais.

E quando a inovação está “casada” com sustentabilidade socioambiental, o retorno pode ser otimizado. Esta potencialidade tem chamado a atenção de organizações como o Programa New Ventures Brasil, parceria do World Resources Institute com o GVces - Centro de Estudos de Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas de São Paulo e de players de mercado, como o fundo Stratus VC III.

Valores intangiveis – alguns considerados até mesmo “filosóficos” - podem ser dimensionados por ferramentas como os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial ou as Diretrizes para Relatórios de Sustentabilidade GRI G3, da Global Reporting Initiative, e medidos por pesquisas de perfil econômico ou metodologias mais complexas.

A pesquisa “Responsabilidade social das empresas – percepção do consumidor brasileiro”, realizada pelos Institutos e Ethos, é um exemplo de medição. Na Edição 2005, por exemplo, 86% dos entrevistados afirmaram que “seu respeito por uma empresa aumentaria se ela fosse parceira de uma ONG ou instituição de caridade para ajudar a resolver problemas sociais”.

O Balanced Score Card é outro método. Idealizado por Robert S. Kaplan, da Harvard Business Review em 1996, o BSC se propõe a medir valor nas organizações, estabelecendo uma métrica tangibilizável. É complexo por natureza e exige alta qualificação de aplicadores e disciplina da organização.

O valor da sustentabilidade

Valores intangíveis derivados da busca pela sustentabilidade elevam a lucratividade de uma empresa no longo prazo. Algumas pessoas ainda não acreditam nisso, mas superado o período de investimento nos “intangíveis filosóficos” da sustentabilidade, o lucro é líquido e certo.

A mais completa tangibilização de valores intangíveis da sustentabilizada que conheço foi realizada por Bob Willard, ex-vice-presidente da IBM canadense e diretor da The Natural Step naquele país. Publicada no livro “The Sustainability Advantage”, de 2002 e apresentada no Brasil em março de 2005 no seminário “Global Mindchange Forum”, faz uma mensuração dos benefícios de uma empresa ao adotar os principios de sustentabilidade socioambiental: um aumento potencial do lucro de 38% e um pontencial benefício de aumento de produtividade de 8%.

Com a ajuda de profissionais cartesianos das maiores empresas canadenses, Willard contabilizou benefícios em 7 grupos:

# redução dos custos de produção (como energia, água, matérias-primas)

# redução das despesas na administração (como energia e materiais de consumo)

# aumento no rendimento (que pode levar a empresa a diminuir a margem e aumentar o share)

# redução de riscos (que proporciona menores taxas de financiamento e leasing)

# redução do aumento dos custos (desacelera espirais de aumento ao inserir fornecedores no processo)

# redução dos custos de atrito (como multas por infrações ambientais, processos trabalhistas, TACs – Termos de Ajuste de Conduta – e no Brasil, custos para subornar fiscais…)

# e aumento na produtividade dos empregados (baseado em menores custos de captação, manutenção e treinamento e em maiores facilidades em atrair talentos, entre outros)

O livro de Bob Willard não está disponivel em português, mas pode ser conhecido neste site.

Se uma empresa, ao adotar valores intangíveis de sustentabilidade socioambiental tem potencial para aumentar seu valor de mercado em até 12%, seu lucro em até 38% e a produtividade em até 8%, parece claro que valores intangíveis podem realmente ser o bem mais valioso desta empresa. E que quanto mais bonzinho com as pessoas e o meio ambiente for uma empresa, mais lucro ela poderá ter. Você ainda duvida?

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